quarta-feira, julho 21, 2004

A Encomenda

Depois de duas mais que merecidas folgas volto confiante para enfrentar mais uma semana de eventos mirabolantes, dignos de figurar no Mr. Ripley's Believe It Or Not. E, mal chego, deparo me logo com uma situação que muitas vezes descamba em algo muito estranho. Correndo o sério risco de me tornar repetitivo, qual Margarida Rebelo Pinto dos blogues, é inacreditável as situações que ocorrem vezes sem conta neste respeitavél estabelecimento. Tantas vezes penso que foi o último acontecimento digno de figurar neste blog, mas, todos os dias, sou novamente surpreendido pelas pessoas. Penso que muitas delas leem assiduamente este blog, vêm à loja e pensam: "Não, aqueles ainda não eram suficientemente estúpidos, acho que consigo melhor". O Homem sonha, a estupidez nasce. E lá vêm eles todos confiantes, loja adentro,  com a firme convicção  de que vão conseguir o novo expoente máximo de estupidez. 
Pois bem, desta vez vou me debruçar sobre o nosso brilhante sistema de encomendas, e tudo o que roda à volta desse sistema. Primeiro, há que focar a nossa atenção no facto de ser tudo manual. O cliente pede um livro. Depois de horas a tentar explicar que só podemos encomendar livros que estão no catálogo, que eles demoram cerca de uma semana, que ligamos quando o livro chegar, aí passamos a tomar nota (manualmente, numa bonita ficha) dos dados do cliente. E aí começam a surgir os problemas. Nomes desde Cudibamba Dadinha, a Lubelinda Costa, Alcindete Maria, e por aí fora, fazem parte do quotidiano da nossa loja. Verdadeiros desafios herculianos de soletração. Mas, há que vencê-los a todos. Depois o cliente parte feliz da vida com o talão comprovativo da encomenda, e nós, depois de contactarmos as nossas lojas, encomendamos os livros. A partir daqui o destino do livro deixa de estar nas nossas mãos.  As lojas da nossa área são servidas por uma imensa, rápida e bem munida frota de... um estafeta. Sim, um estafeta. Reparem: além de não haver um sistema informatizado de encomendas, só há um estafeta para uma área metropolitana e arredores. Genial. Melhor mesmo, e fica desde já a minha humilde sugestão, era mandarmos as encomendas por Pombo Correio, e os livros vêm por  carroça movida a burros. Eventualmente (e há que sublinhar e dar ênfase a este eventualmente) os livros chegam na data prevista. 
Muitas das vezes, os clientes, apesar de avisados várias vezes que as encomendas demoram cerca de uma semana a chegar e que serão prontamente avisados quando o livro chegar, vêm à loja saber do seu livro. Primeiro procuramos. Não encontramos. Depois perguntamos amavelmente se já foram avisados. "Não".  Típico. Depois temos o habitual caso do cliente que chega e diz: "Vim buscar a minha encomenda!". Mas, ao pedir o talão da encomenda, não tem. E mais, não sabe o que encomendou. Não se lembra, mas claro, fica extremamente incomodado quando algum livreiro não se lembra dele. Há que dar toda a razão ao cliente, visto que nesta loja, só temos três clientes, estamos à beira da falência. Realmente é vergonhoso como é que não nos lembramos de cada cliente e cada encomenda. Um castigo justo seria uma chibatada nas costas.  Para a próxima já não acontece.
Claro que também temos casos em que o livro chega ligeiramente, mas apenas ligeiramente,  atrasado. Quando avisado da chegada do livro, o cliente diz "Mas já não quero o guia da Malásia, já lá tive há já um mês".  No reverso da moeda temos o caso em que o cliente vem buscar o livro com um pequeno atraso, apenas para descobrir que o seu livro encomendado foi vendido. Duas vezes.  
O acto de ligar ao cliente para o avisar da chegada do livro apresenta perigos inerentes. Senão vejamos: podemos ligar em má altura, interromper algo, ligar com um mês de atraso, arriscando-nos assim a ser bombardeados com todos os nomes e mais alguns que possamos imaginar. Acontecem situações caricatas, como ouvir famílias aos berros, gatos a saltar para  o telefone, mulheres com voz de homem, homens com voz de mulher, nunca terem ouvido falar do livro e da pessoa que deixou o nome, pessoas que ouvem mal e outras que não querem ouvir. E como eu odeio falar ao telefone. Muitas vezes somos severamente repreendidos por clientes, e consequentemente enviados para o canto da loja durante duas horas, por termos dito uma semana, e terem passado três dias e o livro não ter chegado. Haja vergonha.
Outros clientes fazem encomendas aqui, mas querem o livro noutras lojas, ou ainda em casa delas. Se forem simpáticas, ainda oferecemos umas bolachas e um cházinho, bem como uma manta e uma lareira, para ler o seu livro da Cristina Candeias e poder invocar o Diabo na paz e sossego do seu lar. Têm todo o direito...
Até à próxima...

1 comentário:

Anónimo disse...

mas que grande momento....
se ha ideias que se dizem iluminadas, esta ainda regozija da luz que dá

Benjamin Sachs