quinta-feira, setembro 16, 2004

Os Imortais

Depois de um breve hiato cá está o Livreiro novamente ao vosso dispor. Mas não abusem, por favor.
Bom, recentemente, em mais uma das minhas incursões de âmbito profissional por territórios livreiros, vi-me obrigado a arrumar os livros do Diário de Sofia. Movido por uma curiosidade masoquista, li a contra-capa do terceiro livro, na esperança de desvendar o mistério da idade de Sofia. E eis que, para meu espanto, Sofia, ao entrar para o 12º ano, ainda tem dezassete. Ou seja, 10º, 11º e 12º com dezassete anos. Mas, desta vez menciona que tem quase dezoito. Não te preocupes Sofia, quando acabares o curso de Medicina já tens dezoito. É o realismo da escrita que tanto deve atrair as jovens. Força, continuem. E agora, temos o diário de Mariana. Quem é Mariana? Não sei, mas se for imortal como a Sofia temos sucesso garantido. Melhor, se comprarem o Quinto Livro do Diário de Sofia bem como o Diário de Mariana, em vez de serem forçosamente submetidos a sessões com um psiquiatra para o resto da vida, ganham um diário. Pois é amiguinhas, vocês mesmas podem vir a ser imortais como a Sofia. Mas, desde já vos digo algo, se a Sofia e Mariana se degladiarem até à morte e consequente decapitação porque no fim só pode haver uma, eu compro já!
Imortal é a questão dos descontos. Sim, ainda encontramos almas poderosas que procuram ascender ao céu dos descontos por todo e qualquer meio possível. Temos o caso do senhor que, ao exigir o desconto, refere que é bastante amigo de um dos nossos colegas. Ao verificar a minha desconfiança, disse que não se lembrava do nome, mas que era um rapaz de cabelo escuro. Bom, sendo que na loja existem apenas 5 rapazes que correspondem à descrição... Não quis embaraçar mais o senhor e deixei-o ir. Já uma senhora, com um ar confiante e vencedor, chegada ao balcão e depois de ter atirado devidamente os livros para cima deste com a habitual delicadeza, pede o seu desconto. O meu colga pergunta-lhe porquê. Ela diz que é nossa colaboradora. Um silêncio negro instalou-se. Queríamos ouvir mais. Ela, reparando na nossa indisfraçável desconfiança, prosseguiu: "Sim, sou vossa colaboradora. Sou a vossa fornecedora de RECORTES DE JORNAIS!". Se alguém merece um desconto é esta senhora. Genial, brilhante, inovadora. Ouvimos diariamente várias desculpas. Mas, esta, pela originalidade, merece o livro gratuitamente numa bandeja. Pensei em convidá-a para actuar em casamentos ou despedidas de solteiros. Quem sabe, iniciar uma carreira de artista? Recortes de jornais, portanto... Muito bom.
Falando em genialidade, temos o típico caso da apurada e trabalhada pronúncia inglesa de alguns clientes. Enquanto trabalhava com umas facturas, um senhor apresenta-se pelo meu lado direito e pergunta: "Tem o livro CINK?". Parei um segundo para pensar. Nesse segundo, tenho de discernir rapidamente o que o cliente realmente deseja. Sem demoras, acrescentou: "cink. CINK. PENSAR!". Boa, não digas a ninguém para pensar junto à àgua, senão ainda se afoga. Lá fiz a habitual e mandatória busca que veio revelar bastantes livros com THINK (ou cink, como preferirem) no título. Pergunto ao senhor se ele sabia nome do autor, ao que ele responde: "Se me disser qual é eu digo-lhe o nome". Descartes... Nietzsche... Heiddeger... Nada se compara a este homem e à sua mente avançada.
O novo livro de Isabel Allende, Bosque dos Pigmeus, tem se vendido bastante bem, como não poderia deixar de ser. E, sendo um favorito do público em geral, já teve o seu nome distorcido das mais variadas maneiras, entre as quais: O BOSQUE DOS COGUMELOS e o O BOSQUE DOS PIGMENTOS. Já o Código Da Vinci Descodificado continua a ser muitas vezes denominado como o DESCODIFICADOR. "Isto é o romance, já tenho. Tem o DESCODIFICADOR?" perguntam os clientes. Não sei que pretendem eles descodificar, mas se querem ver mulheres desnudas em actos impróprios para menores esqueçam. Um livro que vai dar que falar é Eargon, um livro sobre um rapaz e um dragão, escrito por um jovem de 15 anos. Que, se lermos no livro afinal tem 20. Enfim. Diversos clientes têm demonstrado interesse no livro, e a pergunta que mais vezes ecoa através do ar corrompido pelo belo sistema de ar condicionado é: "É uma trilogia? Onde estão os outros?". A obsessão humana pelas trilogias é extremamente curiosa. Sai um livro, o primeiro do rapaz, e o público já pergunta pelos outros dois. Vendo bem, soa muito bem dizer: "Ah, sim, já li a Trilogia. Sim, três livros. Uma trilogia. Vejam como sou fixe." Só posso imaginar os fãs do Harry Potter: "Trilogia. Bem, eu tou a ler uma... hmmm... pois...". Pentalogia não soa minimante bem, quanto mais heptalogia. Já sabem, para todos os futuros e presentes escritores, a Trilogia é o caminho. Palavra de Livreiro.

2 comentários:

Anónimo disse...

80% - Bom +

Anónimo disse...

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Senhor Professor