sexta-feira, fevereiro 02, 2007

Quem é o Mais Forte?

Para aqueles que temiam que eu tivesse perecido perante a temível e dura formação, eis que eu volto para vos sossegar. (A minha empresa põe os clientes em primeiro lugar) Nada temam, a formação não foi a lavagem cerebral que toda a gente dizia que ia ser. (A minha empresa é a melhor do mundo.) É verdade, aquilo até foi engraçado, ver que nas outras lojas também é tudo doido, quer sejam os clientes quer os colaboradores. (Vender é importante, e o cliente é de ouro.) Mas a formação passou-se bem, afinal de contas, foram apenas dois dias. (O atendimento Premium é importante para fidelizar o cliente). Claro que quando voltei ao trabalho não pude aplicar nada do que aprendi, mas não dei o tempo por mal empregue. (Temos de ajudar os clientes a ajudar a empresa.) Há sempre coisas úteis que ficam e que ajudam a desempenhar melhor esta espinhosa função. (Vender. Vender. Vender. Vender. Vender.)
E, logo um dos primeiros clientes que apanho é um senhor que, antes sequer de eu ter posto em prática as tácticas de aproximação ao cliente, já está a disparar em todas as direcções: “QUERO UM LIVRO AHN? MAS LITERATURA A SÉRIO AHN? TENHO 3500 LIVROS AHN? E ESCREVO CONTOS.”. Eu respondi apenas: Ahn… E desloquei-me para as novidades, para ver o que poderia agradar ao senhor. Enquanto pesquisava, ele continuava: “3500 LIVROS AHN? E ESCREVO CONTOS. E QUERO UM LIVRO A SÉRIO, NADA DESSAS PARVOÍCES QUE POR AÍ ANDAM”. Comecei por lhe sugerir alguns livros, que ele prontamente recusou, dizendo pérolas como: “O QUÊ? JÁ LI TUDO DESSE AUTOR AHN?” (quando o autor em causa apenas tinha um livro), “JÁ LI ISSO PRÁI HÁ TRÊS ANOS AHN?” (quando o livro era português e tinha saído o ano passado), “JÁ LI ISSO EM FRANCÊS! JÁ LI ISSO EM ESPANHOL! JÁ LI ISSO EM ITALIANO AHN? JÁ LI EM INGLÊS!” eram as respostas que ia dando conforme eu ia lhe passando livros para a mãe. Quando lhe dei o novo livro de José Luís Peixoto para a mão (brilhante, claro), o cliente diz: “JÁ LI TUDO DELE AHN? ESTE NÃO! HMMMMM… É MAÇUDO?” pergunta o cliente, e eu disse que não era nada maçudo. “ENTÃO E DIGA ME LÁ, É LINEAR? NÃO GOSTO DE CONFUSÃO AHN?” Muito linear, é uma linha trás da outra, não há que enganar… Mostrei-lhe a parte da maratona, e o cliente até ficou azul: “AH QUE CONFUSÃO! NADA DISTO, NADA DISTO AHN?”. Depois mostrei-lhe Murakami, e ele folheou e disse: “OUÇA LÁ, EU NÃO SEI QUANTO A SI, MAS EU DE CERTEZA QUE NÃO FALO COM O MEU GATO E ELE ME RESPONDE! NÃO QUERO ISTO!” Elucidativo da gentileza do senhor. Farto de mostrar novidades, passei para os clássicos da literatura. A resposta era invariavelmente: “TENHO 3500 LIVROS AHN? ESCREVO CONTOS!”: Quando lhe mostrei Dostoievsky, disse: “JÁ LI EM RUSSO AHN. ISSO É MAÇUDO, SÓ SE FOSSE PARA LER NAS ESTEPES DA SIBÉRIA, É MAÇUDO!”. Era claramente isso que Fiodor Dostoievsky tinha em mente quando escreveu “O Idiota”. Eu tentei manter critérios de qualidade na apresentação dos livros, mas, passado dez minutos já não fazia ideia do que lhe estava a passar para a mão. E foi assim, a escolher aleatoriamente, que ele se decidiu finalmente por dois livros. Os livros para ele ou não eram literatura a sério ou eram maçudos.
E não podia partir sem vos falar de uma personagem já habitual da loja. Não temos (ainda) alcunha para ele, mas ele é merecedor de uma. Costuma ir à loja, nunca comprou nada, e consegue fazer as perguntas mais estranhas e sem sentido ou sem utilidade que se possa imaginar. Por exemplo, ele passa na loja, aproxima-se do Santo e pergunta: “Quem é mais forte, a Patrícia ou o Bernard Cronwell?”. O Santo teve de pensar três vezes antes de responder, caindo a sua resposta no Bernard. Eu, se tivesse no lugar dele escolhia a Patrícia, porque apesar de ser mulher ainda levanta 80kg com facilidade, o que não é de desprezar. Não contente, o cliente continua “Então e quem é mais forte, o Bernard Cornwell ou o VacVandermint?”. O Santo nunca tinha ouvido falar do VacVandermint, mas não hesitou em eleger este como o mais forte. E lá seguiu, o cliente, feliz da vida. Mais tarde viemos a perceber que ele se referia a Val McDermid, o que tinha obrigado o Santo a mudar a sua resposta. A próxima vítima fui eu. Perguntou-me como é que se fazia uma base de dados de livros, como é que nós a tínhamos organizado, como é que a podíamos melhorar. Depois da longa (e eficiente) resposta que lhe dei, perguntou-me quem era melhor, se o John Le Carré ou o Robert Wilson. Disse que era o John Le Carré, e ele disse: “Pois, eu prefiro o Robert Wilson, é que vi o filme “O Fiel Jardineiro”, depois li o livro e não havia nada de novo, parecia tudo muito familiar.” Não argumentei esta parte, porque ele tinha toda a razão. Depois pediu-me para comparar o tamanho dos capítulos de um e de outro, e claro, se eram mais fortes que o Bernard Cornwell. Tive que dizer que não e dar a mão à palmatória, o Bernard é o maior.

18 comentários:

Anónimo disse...

Olá,
Sinto algo dentro de mim.
Cada palavra sua toca-me como nunca tinha sido tocada. Antes mesmo de começar a ler as pernas tremem-me e arrepios percorrem-me.
Não imagina o quanto é bom imaginá-lo a escrever para mim, sempre a pensar em mim, querendo estar perto de mim.

Obrigada.

Beijo Fofo.

Anónimo disse...

Se uns perdem a inspiração para a escrita outros têm a mania que a possuem. Isto está pior que a fotonovela da Oficina do Livro!

O Livreiro disse...

Lá vamos nós outras vez. Começa bem isto.
Finalmente o Viscoso disse alguma coisa acertada.
Onde anda o resto da pandilha imaginária e esquizofrénica?

Anónimo disse...

Viscoso não, viçoso s.f.favor.

O Livreiro disse...

Ah, peço perdão, é que as teclas tão mesmo ao lado umas das outras.

m disse...

Caro livreiro, um abraço cordial desde a formação. Belas risadas que demos recordando o Prof. Karamba :)

E Viva o Sr. Viscoso!!!

O Livreiro disse...

Cá está mais um companheiro de formação! Grande abraço, e há que sempre recordar as performance holliwoodescas! Mas houve algumas trocas de ideias bastante interessantes, isso é verdade.
O Sr. Viçoso, tal como o dicionário indica, é terno e mimoso, daí a necessidade de atenção... Group hug no Viçoso!

Anónimo disse...

O sr. livreiro precisa de me explicar em que dicionário retirou esses sinónimos, talvez tenha sido no mesmo em que tem como entrada o verbo tar...eu tou, tu tás ele tá...

No que diz respeito à falta de atenção, não fui eu que criei um blogue para dar a conhecer a minha escrita e a minha vida profissional!!O sr. tem que me ver como um fã que dá as suas opiniões, mesmo que elas não coincidam com as suas. Vamos lá deixar de ser mimados e aceitar os diferentes pontos de vista que apresento, isso sim é de homem, perdão de livreiro.

O Livreiro disse...

O motivo da criação deste blog é um e apenas um: eu estava farto de contar as mesmas histórias vezes sem conta sempre que encontrava os meus amigos. Logo, decidi escrevê-las, e eles que viessem ler. E assim tem sido, já lá vão dois anos. O tempo voa...
Isto não é uma questão de pontos de vista... Mas faz-me alguma confusão vir alguém que não diz quem é (ou pelo menos dá pistas de quem possa ser) e fala de mim e dos meus colegas como se nos conhecesse.
Já agora, o dicionário é o da Texto. Secalhar devia ter visto no da Porto.
Correcções gramaticais e ortográficas? O Viçoso é a Edite Estrela! É uma hora, shora Edite!

O Livreiro disse...

Olha, enganei-me outra vez, disse hora em vez de honra. Vá buscar a chibata, Dra. Edite!

Anónimo disse...

ES O MAiOR LIVREiRO =) * agora qnt aos comentario, devo defender o Sr.Livreiro, este blog nao e´obrigatorio logo quem o le fa-lo de livre vontade e pq gosta da escrita ou por curiosidade ou ainda pq gosta da criatividade e sentido de humor.
tenho dito..

Anónimo disse...

Mas isto agora é só comments de pitas sem conhecimento de língua portuguesa e de desesperadas por atenção? Sr. Livreiro, venha cá por ordem nisto, ou pelo menos um post que traga algum exemplo de qualidade literária aos seus visitantes semanais!

O Livreiro disse...

Eu já não consigo por ordem nisto, é a loucura total.
Mas, um novo post está no horizonte, portanto é só uma questão de esperarem. Sentados. Por causa das varizes, e tal.
Saudações cordiais para os esquizofrénicos deste Portugal.

Anónimo disse...

Olá sr. livreiro
Welcome a board! Bem-vindo às lides. Como sempre mandei umas boas gargalhadas com a leitura do seu post. Já sentia algumas saudades! Quanto aos comentários.. it's a free country pelo que aceita ou não conforme o que lhe apeteça (este é um dos sintomas da esquizofrenia....)
Aguardo sentada (apesar de não ter varizes!) o novo post com os cromos do costume!

Anónimo disse...

Aparte das esquizofrenias ou não, concordo com a sirocco, no fundo o que interessa são os posts do Livreiro.

Mais uma vez fartei-me de rir, parece que consigo visualizar as situações apenas lendo os posts, parabéns.

Com isto, impõe-se uma pergunta: já que o Livreiro está integrado no mercado dos livros, para quando uma edição do Livreiro em papel? Com a maior das honestidades, eu compraria. E penso que a maior parte dos seus leitores também.

Um abraço

O Livreiro disse...

Desde já agradeço as palavras de incentivo do Sr. Fernandes. A edição em livro é um assunto utópico, que será muito dificil, sen não mesmo impossível, isso acontecer. E eis porquê:
- Não sou famoso.
- O blog tem poucas visitas. (as personalidades múltiplas dos esquizofrénicos não contam).
- Não há polémica (e eu já tentei, mas parece que ir trabalhar nu não resulta).
- Não tenho nenhum padrinho famoso. (Mas, Ricardo Araujo Pereira pá, se estás a ler isto pá, estás à vontade).

Anónimo disse...

Pronto, era só uma ideia, mas também calculo que seja complicado editar um livro mesmo que se tenha mérito.

Coloco-lhe apenas outra questão à qual não sei se me pode dar resposta: nos seus links para outros blogs tem um para "Plinio Plagius, O Gladiador", é o Livreiro que escreve? É que está fenomenal e gostaria de congratular o autor.

Um abraço

O Livreiro disse...

E era uma boa ideia! O problema é que não é exequível. A edição de um livro não depende nem um pouco da qualidade deste. É tudo uma questão de conhecimentos e mercado. Obviamente que gostava de ter um livro, mas penso que não será o Livreiro a dar me essa satisfação. Já um livro normal é difícil de editar, então um livro que tem origem num blog desconhecido...
Quanto ao Plínio Plagius, sim, sou eu o autor. É curioso que alguém ache piada porque aquilo não é mais do que uma enchente de private jokes entre mim e os colegas aqui do estabelecimento.
E dizem que ali no Pior Que Os Putos há um tal de Sr. Bastonário que tem uma escrita semelhante à minha. Mas eu não ligo a rumores.
Mas, mais uma vez, obrigado pelas palavras de incentivo, é inacreditável aparecer alguém que perde o seu tempo para elogiar-me.