domingo, fevereiro 19, 2006

Sempre a Aprender

Por vezes penso que sei tudo. Que domino várias áreas. Afinal, com mil raios, sou o Livreiro. Tenho ao meu dispor um manancial quase infinito de sabedoria. Mas, não. Há sempre um ou outro cliente que prova de forma irrefutável que eu tenho muito para aprender. Um casal já na curva descendente da vida vem comprar um livro sobre o reumatismo. Tudo aparentemente normal, até chegar a hora de pagar. Aí, saca cada um a sua carteira e agem como se fosse pagar. Eu pensei que o senhor ia ser cavalheiro e pagar o livro, mas não. Simulou que ia pagar mas retirou a nota no último segundo. Ficou então a senhora com uma nota de 10 na mão (o que nem era suficiente para pagar o livro…) bastante confusa a olhar para mim. Aí, o senhor, premeditadamente, surge para a salvar com uma nota de 5. Tira-lhe a nota da mão e diz: “Dá cá que eu pago isso.” Deu me as notas, e quando recebeu as moedas do troco, colocou as na mão da senhora dizendo: “Tás a ver? Ainda ficas com o troco!”. E lá partiu todo contente, com a senhora ainda bastante confusa a contar as moedas. Isto é que é um cavalheiro.
Sempre pensei que conhecia certos autores. Pensei que Mia Couto fosse um conceituado autor moçambicano. Mas não. A minha última cliente, vendo o livro que a filha ia comprar, diz: “Mia Couto? Ah, a mulher do Freitas do Amaral… Escreve bem, pois…”.
Mas há coisas muito mais bizarras. Não tão bizarras como o “Trio Maravilha”, mais ainda assim estranhas. Atendi um telefone num destes dias (devia estar tudo ocupado. A trabalhar claro…) e do outro lado surge, fantasmagoricamente, uma voz fina e rouca, aparentando ser de uma senhora idosa. Depois de confirmar três vezes que estava efectivamente a falar com a loja certa, pensei que ela fosse perguntar se teria ficado aqui algum cartão Multibanco ou se teríamos a encíclica do Papa Bento XVI. O discurso foi o seguinte: “Olhe, eu e a minha amiga estivemos aí, e comprámos uns Kama Sutra que estavam em cima do balcão.” Aqui já estava a tentar tirar as imagens macabras da cabeça… E ela continuou: “Ah, é que nós estivemos a ver o livro, mas só quando chegámos a casa é que reparámos que estava em Inglês!”. É normal, estavam entretidas a ver as imagens não é marotas? Esta terceira idade… Não pára de surpreender. Ainda agora, um casal também já membro desse restrito clube esteve aqui nas suas compras de Domingo. Ele levou um livro de Arte sobre Veneza, na módica quantia de 130€, e ela vinha com um pequeno livro cúbico para o balcão. Quando pego nele para o registar, diz ela muito apressada: “Esse é para mim, esse é para mim!”. Eu nem tinha sequer olhado para o livro, mas com tanto alarido não pude evitar. Ela levava o já clássico Male Nudes. Ainda bem que é para si. Se fosse para o seu marido é que era mais estranho.
Muita gente tem perguntado se há o livro do filme Brokeback Mountain. Devo dizer que há. Mas nós não temos. É um filme mítico, nem que seja só por ter alterado o significado de uma das mais antigas brincadeiras entre as crianças. Se o seu filho disser que vai brincar aos cowboys com o vizinho do lado é melhor investigar.
Deixo aqui, antes de partir, o link para a fundação do nosso amigo e companheiro dos livros, Gulbenkian. Podem ir a Pro Atlantico e ver do que se trata. Digo apenas que se puderem deixar roupas e livros ele agradece. E eu também, porque assim não tenho de ouvir. E já agora, vão a algum dos eventos como por exemplo o festival de Jazz e Stand-up com o grande Eduardo Madeira. O Eduardo Madeira além de grande, é o maior. Mas há que dar o mérito ao Gulbenkian pelo seu empenho. Mas, sinceramente, não estou a ver aquilo a correr bem em Cabo Verde. Primeiro, o homem é muito distraído. Tão distraído que nem se lembra do nome dos colegas da missão. Depois há outro problema. Ele não consegue (nem que a sua vida dependesse disso) fazer duas coisas ao mesmo tempo. Tentar falar com ele enquanto ele está ter uma conversa no MSN é basicamente impossível. Já tive conversas bem mais enriquecedoras com pessoas de Leste que não arranhavam sequer o português. Portanto é apenas apostar (acho que a Betandwin já anda a tratar disso) que calamidade é que ele irá provocar primeiro. Sim, porque já a imaginá-lo a esquecer-se de apagar a fogueira porque estava a ler as crónicas do Lobo Antunes.
E reparem, o homem, para além de ser Livreiro, Músico, Escritor, Missionário e estudante de Filosofia, agora também é Cliente-Mistério. E como ele executa bem essa tarefa. Basta a rapariga que está a ser avaliada sorrir para ele e ele dá logo nota máxima a tudo. Já a senhora do .Holmes-Place ganhou logo a simpatia dele quando elogiou a sua farta penugem.
Até à próxima.

1 comentário:

Anónimo disse...

Olha olha, agora andam armados em bons samaritanos...
Tambem a casa Pia e a santa casa são bonzinhos e vejam uns só dão po traz e os outros dão mto menos do que ganham...
Aqui há gato...